Agosto
31 dias e nenhum feriado. É só mais um ciclo bem fechado de dias e dias que vem e vão. Mês do desgosto, rima sem significado ou expressão de um descontente em viver esses dias aglomerados?
Para alguns o agosto é de Deus.
Se quer saber, para mim esses 31 dias são cheios de significados que marcam a dualidade entre morte e vida, presente e passado. Ah, gosto de pensar nesse mês como o chiclete refeição completa do Willy Wonka: cheio de sabores e sensações. Porém no meu chiclete os sabores são mais complexos.
A primeira mordida, o começo do mês é sobre a última vez que a vi, viva e assustada em uma ambulância, querendo voltar para casa. É também a ansiedade de uma estudante diante do fim do curso.
O mês vai passando e em seu meio sinto o gosto da inadequação ao ser lembrada de que não me encaixo nesse mundo direito. Há algumas partes boas, como o doce delicioso dos bolos de aniversário de pessoas que amo. Me lembra também o gosto doce da descoberta de uma paixão adolescente.
Já quase no fim, os sabores ficam ainda mais complexos e confusos. Contrastantes, eu diria. Começo a sentir o gosto horrível da infecção do corpo que está vivo, mas que já não responde. Mais uma mordida e nessa há gosto de esperança e de água que corre e leva impurezas, trazendo Vida Nova. Logo em seguida, o vigésimo sétimo pedaço tem gosto agridoce das dores e delícias de uma escolha que envolve propósito.
Meu chiclete refeição finalmente chega ao fim. Sobram os pedaços 30 e 31. O 30 é quase intragável e tem o gosto de morte em porção dupla acompanhado por lágrimas temperadas com sal a gosto.
Com amargor ainda na boca, ergo o último pedaço hesitante. Não sei se posso mais suportar tanto desgosto, porém ele é tão surpreendente quanto pessoas rindo em um cemitério.
As dores não passaram, mas o último pedaço cheira a misericórdias renovadas e tem gosto de sol raiando para nos mostrar que começou um novo dia e a primavera logo chegará.